Cobrança de Imposto de Renda de doador em adiantamento de herança
Recentemente, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), ao analisar o processo RE nº 1.439.539, rejeitou um recurso da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que buscava a incidência de Imposto de Renda (IR) sobre as doações de bens e direitos realizadas como adiantamento de herança a familiares.
O caso discutido destacou como a legislação interpreta o aumento de patrimônio e o momento em que ocorre o fato gerador de tributação ao transferir bens para herdeiros.
Essa decisão reforça uma importante jurisprudência, reiterando que o Imposto de Renda não deve incidir quando não há um aumento real do patrimônio da pessoa física.
Neste guia jurídico, explicaremos tudo sobre essa decisão, o papel do STF na defesa da interpretação justa da Constituição Federal no que diz respeito à incidência tributária, além dos impactos práticos para contribuintes que realizam doações em vida a seus filhos ou outros familiares.
De onde partiu essa decisão?
No recurso apresentado pela PGFN , o principal argumento utilizado foi no sentido de que no ato de doação dos bens haveria um acréscimo patrimonial que justificaria a incidência do imposto.
A lógica da Procuradoria era a seguinte: os bens transferidos sofrem valorização ao longo do tempo, resultando em um valor de mercado superior ao custo de aquisição inicial.
Portanto, esse aumento de valor dos bens constituiria, segundo a PGFN, fato gerador do Imposto de Renda, ainda que o bem estivesse sendo doado e não vendido.
Contudo, já na ocasião do julgamento do processo na segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) havia decidido que o Imposto de Renda não incide sobre o ato de doação, já que, nesse contexto, o doador não está expandindo seu patrimônio, mas sim o transferindo, reduzindo sua própria riqueza.
Essa decisão foi levada ao STF, que, por fim, ratificou o entendimento de que não ocorre um acréscimo patrimonial para o doador.
Qual foi a base para a decisão do STF?
O relator do caso, ministro Flávio Dino, mencionou em seu voto que o fato gerador do Imposto de Renda é o acréscimo patrimonial. Ao doar um bem, o doador diminui seu patrimônio e, assim, não haveria razão para cobrança de Imposto de Renda sobre essa operação.
A decisão também considerou o princípio constitucional de evitar a bitributação, uma vez que, para doações e heranças, já há a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), um tributo estadual que incide sobre transferências de bens e direitos.
Outro ponto relevante na decisão foi a questão da “jurisprudência consolidada”. O STF já vinha, em julgamentos anteriores, estabelecendo a interpretação de que apenas o efetivo aumento patrimonial pode ser alvo do Imposto de Renda.
A transferência de bens a familiares, quando feita como antecipação de herança, portanto, não preenche esse requisito.
O que é Acréscimo Patrimonial e o Fato Gerador de IR?
Para entender a decisão, é necessário conhecer o conceito de acréscimo patrimonial, um dos principais fatores na definição do fato gerador do Imposto de Renda.
O acréscimo patrimonial ocorre quando uma pessoa obtém um ganho financeiro que aumenta seu patrimônio líquido. Isso pode ser visto em operações como a venda de um imóvel com lucro, recebimento de dividendos de ações ou salário mensal.
No caso da doação em adiantamento de herança, entretanto, não há acréscimo patrimonial para o doador que, ao transferir o bem, reduz seu próprio patrimônio em favor de outra pessoa.
Para facilitar o seu entendimento, veja o exemplo a seguir:
Exemplo: Doação de imóveis ou ações de empresa como adiantamento de herança
Um pai adquiriu há 20 anos um imóvel pelo valor de R$ 100.000,00, assim como ações de determinada empresa pelo valor de R$ 20.000,00. Hoje, esse imóvel está avaliado em R$ 500.000,00 e as ações em R$ 50.000,00.
Caso ele decida doar tais bens como adiantamento de herança ao seu filho, a diferença entre seu valor de aquisição e seu valor de mercado — os R$ 400.000,00 de valorização do imóvel e os R$ 30.000,00 de valorização das ações —, na visão da PGFN, constituiria uma espécie de “ganho” que deveria ser tributado.
Entretanto, conforme definido pelo STF, essa diferença de valor não representa um aumento no patrimônio do doador. Pelo contrário, ao doar tais bens, ele reduz seu patrimônio. Por isso, o STF entende que não há base para a cobrança do IR.
Além disso, quando um bem é doado como adiantamento de herança, já existe a incidência do ITCMD, o que, segundo o entendimento do STF, torna injusta e inconstitucional a aplicação adicional do IR sobre a mesma operação.
Esse entendimento estabelece um direcionamento claro para os órgãos de fiscalização e proteção dos contribuintes.
Aos contribuintes que desejam organizar sua sucessão patrimonial em vida, a decisão permite que esse processo ocorra sem receio de aumentos indevidos na carga tributária.
Conselhos para planejar a transmissão de bens
De qualquer forma, alguns conselhos são bem-vindos nesse planejamento:
- Registro e avaliação adequada dos bens: manter uma documentação organizada dos valores de aquisição dos bens que serão doados é essencial, pois facilita o entendimento da Receita Federal sobre a ausência de ganho no ato da doação;
- Planejamento com um especialista: o acompanhamento de um advogado especialista em direito Tributário ou Sucessório é importante para garantir que o processo de doação siga todas as normas legais, especialmente em relação ao ITCMD;
- Acompanhamento das alterações nas leis: as leis tributárias podem mudar e acompanhar essas mudanças será essencial nesse planejamento.
O que é o ITCMD e qual é o seu papel?
O ITCMD é um tributo estadual que incide sobre a transferência de bens por doação ou herança.
No entendimento do STF, a cobrança desse tributo já supre a necessidade de tributação sobre a transferência patrimonial, garantindo que não haja bitributação.
Em muitos estados, o ITCMD é uma fonte importante de arrecadação, e as alíquotas variam, podendo chegar a 8% sobre o valor doado.
Esse tributo foi muito importante para formar essa visão do STF, que protege os contribuintes e não dá margens para interpretações equivocadas da legislação tributária.
Conclusão
Neste artigo, você pôde entender a decisão da Primeira Turma do STF, que reafirmou o direito dos contribuintes ao decidir que não incide Imposto de Renda (IR) sobre a doação de bens como adiantamento de herança.
Essa decisão é um marco importante, pois impede uma possível bitributação: uma vez que já existe o imposto estadual, o ITCMD, para tributar as transmissões de bens por doação ou herança, não há justificativa para a aplicação de IR sobre o mesmo fato gerador.
Para que o contribuinte possa fazer doações com segurança e dentro dos limites legais, é essencial observar algumas práticas importantes, como:
- manter uma documentação organizada sobre a origem e o valor dos bens;
- buscar o acompanhamento de um especialista em Direito Tributário.
Esses passos ajudam a garantir que o processo seja realizado sem riscos de questionamento pela Receita Federal e em conformidade com a Legislação Tributária.
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